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Nathália Petry

Aceitação corporal não é se forçar a se amar

A aceitação corporal é libertadora. Ela te liberta para aceitar quem você realmente é, te liberta para aceitar os outros como eles realmente são, e te liberta para enxergar um mundo mais bonito. De fato, se aceitar promove uma grande quebra de padrões que são impostos às mulheres e considero um importante ato de protesto.

Porém, em meu consultório, acabo encontrando um cenário que não representa este sentimento de acolhimento que deveria provir desse ato de libertação: eu encontro ainda mais culpa sobre as mulheres.

Elas têm me dito que entendem a importância da auto aceitação, e que elas, por lutarem por seus direitos como mulher, sentem que deveriam se aceitar, mas não conseguem. Elas realmente não conseguem aceitar seus corpos como são, e se sentem culpadas por isso.

Diante disso, gostaria de promover uma reflexão sobre o que é de fato a aceitação corporal. Porque de maneira nenhuma, a aceitação corporal deveria ser mais uma imposição e fonte de culpa para as mulheres.

1) Aceitação não é sobre se forçar a se achar linda. Mas sobre se questionar sobre o porquê você não vê beleza em si.

Talvez valha a pena perceber que a categorização de beleza é algo que parte de uma comparação. Sim, quando consideramos algo como belo (ou feio), é porque temos um parâmetro de comparação em nossa mente.

Dessa forma, ao ditarmos um corpo como feio, é porque estamos o comparando com algum referencial do que deveria ser um corpo belo. Faz sentido?

Talvez a aceitação corporal não seja sobre se forçar a se achar linda a todo custo. Mas em se questionar quais são os parâmetros de corpos que povoam sua mente.

Talvez seja sobre se dar conta de que há estatísticas que colocam que os padrões de beleza atuais (corpo magro, branco, longilíneo) representam apenas 1-2% da população mundial. E que talvez estes padrões não te representem. Isso é uma questão genética.

E não é uma questão de disciplina, ou força de vontade. A sociedade nos diz que nós podemos mudar nossos corpos como quisermos (lembre-se que nessa busca por essa mudança, provemos bastante energia e dinheiro para várias indústrias), mas isso não é verdade.

Vamos ilustrar. Imagine os cachorrinhos. Cada um tem uma raça, um formato, um estilo... O quão angustiante seria a vida de um poodle se ele vivesse buscando ser um pastor alemão?

E a pergunta: o quão difícil e angustiante tem sido a sua vida buscando ter um corpo que não necessariamente é o seu?

Talvez aceitação corporal seja sobre entender que todos temos uma genética. Que somos diferentes, porque fomos especialmente desenhados para sermos diferentes uns dos outros.

Talvez a aceitação corporal não seja sobre se forçar a ver linda. Mas se questionar diariamente porquê não conseguimos enxergar a beleza que existe em cada uma de nós.

2) Aceitação não é sobre se amar a todo custo. Mas se questionar porquê é tão importante para você mudá-lo.

Eu gostaria de ressaltar veemente que o seu corpo é seu. E ele diz respeito a você, e a ninguém mais. Então, sim, você tem o direito de querer mudá-lo - e de fazer o que você quiser com ele - e isso não te faz menos mulher ou uma pessoa fraca. Seu corpo é seu.

Talvez a aceitação corporal não seja sobre forçar as mulheres a se aceitarem seus corpos na marra. Mas talvez seja sobre proporcionar a todas as pessoas uma reflexão sobre o porquê desejamos tanto mudar nosso corpo.

A questão dos padrões de beleza não é uma questão de beleza em si. Ela vai mais além. Somos levados, desde pequenas, a acreditar que é no corpo perfeito que encontraremos felicidade, sucesso, amor, e acolhimento. Somos levadas a acreditar que é apenas no corpo perfeito que podemos nos sentir belas, amadas, capazes e bem sucedidas. Que é apenas quando tivermos aquele corpo que idealizamos que poderemos fazer aquela viagem dos sonhos. Ou ir à praia. Ou ter uma boa auto estima. Ou poder casar. Ou tantas outras coisas.

Você se sente assim? Será que sua grande dificuldade em ter um relacionamento melhor com seu corpo esteja nessa crença de que ele é um obstáculo para sua felicidade? De que ele é um obstáculo para seus sonhos? De que ele é um obstáculo para sua auto estima?

Talvez a aceitação corporal esteja em entender que seu corpo não é um obstáculo. Pelo contrário, ele é um instrumento para vivermos, sermos quem somos e realizarmos nossos sonhos.

3) Aceitação não é sobre se amar incondicionalmente para sempre. Mas sobre constuir um relacionamento consigo.

Tendo em mente as reflexões acima, é hora de nos questionarmos, então, o que é realmente a aceitação corporal.

A aceitação corporal não é decidir e sentir instantaneamente que você é linda e se ama integralmente. Se você espera isso, talvez esteja aqui sua frustração.

Bom, imagine o cenário. Você teve um relacionamento ruim com essa pessoa durante muitos anos, a xingou mentalmente e verbalmente em vários momentos, a considerou uma pessoa decepcionante, cultivou um sentimento de repulsa por ela, e tentou insistentemente mudá-la a todo custo. Em um belo dia, te contaram que aquilo que você acreditava sobre aquela pessoa não era verdade, e fazia parte de uma picuinha de outras pessoas. Você decide então que aquela pessoa merece uma segunda chance. Será que de um dia para o outro você cairia novamente de amores por ela? Sera que na primeira frustração que você tiver, você não irá se questionar se você não estava certa em repudiá-la? Será que você não tinha tantos sentimentos negativos por ela que agora é dificil desassociá-los? Será que você não está tão acostumada a xingá-la que agora é difícil enxergar os pontos positivos?

(Fiquei impressionada em perceber que não sinto isso em relação a nenhuma pessoa, sendo até difícil descrever este exemplo, mas que já senti isso pelo meu corpo. Não é tristemente impressionante nos darmos conta que somos (ou já fomos) nossa pessoa menos favorita no mundo?)

Mas voltando ao exemplo: será que vamos aceitar novamente aquela pessoa de um dia pro outro? Será que vamos ter um sentimento bom por ela assim de repente? Pois é, o mesmo acontece com nosso corpo. Talvez a aceitação corporal não esteja em se forçar a se amar incondicionalmente. Mas em começar a construir um relacionamento consigo.

E assim, da mesma forma que começamos a reconstruir um relacionamento com alguém, podemos fazer isso com nosso corpo:

começando, pouco a pouco, a perceber que ele não está errado (que as vozes da sociedade é que estão erradas), que ele tem valor, que ele tem beleza;

parando, pouco a pouco, de se xingar, de se auto criticar, de se depreciar;

permitindo, pouco a pouco, que os elogios das outras pessoas penetrem nossa alma;

admirando, pouco a pouco, as coisas que seu corpo te permite fazer - podemos fazer tanta coisa!;

e se dando conta, pouco a pouco, que não é tão ruim assim ser você!

Em conclusão, talvez a aceitação corporal não seja uma decisão única e pontual, que levará a um morrer de amores instantâneo por seu corpo. Mas talvez a aceitação corporal seja uma série de reflexões e decisões diárias que, pouco a pouco, vão mudando seu relacionamento consigo mesmo.

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